O sociólogo português Boaventura de Sousa Santos publicou no início de junho, um artigo que resume não só o momento em que estamos passando, mas faz um levantamento histórico e crítico em cima de diversos momentos que marcaram a história da nossa pós-modernidade.
No artigo, Boaventura inicia o texto falando sobre qual o conceito do tempo, refere-se a Santo Agostinho e levanta algumas questões relacionadas a terminologia. Isso para contextualizar o que estamos passando, por causa do novo coronavírus, e as possíveis “marcas” que serão deixadas posteriormente.
Penso que vai provocar um abalo tectónico no nosso modo de ver e sentir a sociedade em duas linhas de fractura: a hierarquia temporal entre o antes e o depois, e a hierarquia natural entre o inferior e o superior. As opções serão a prazo dramáticas e, no melhor dos casos, duas novas ordens temporais emergirão com destaque: contemporaneidade e complementaridade. Boaventura
Ele reforça o abalo nas visões eurocêntricas, nas suposições hierárquicas de senso comum e que essa nova era virá a ascensão de questionamentos e modos diferentes de ver a vida. Dentro desta argumentação ele questiona a resposta à doença, dos ditos países subdesenvolvidos, conhecidos como pobres, uma vez que, estes buscaram rapidamente soluções ou formas de interferir a disseminação do vírus, enquanto a realidade dos países ricos, foi contrária e não houve de fato uma busca por estagnar as contaminações ou de solucionar os problemas.
A pandemia não inverte as actuais hierarquias no sistema mundial. Este assenta em três dominações: o capitalismo, o colonialismo e o patriarcado. Enquanto elas se mantiverem, o Norte global continuará a impor as suas regras desiguais ao Sul global. Boaventura
O poder do Estados Unidos (EUA) é questionado, uma vez que este se retrata como salvador do mundo, a maior e mais forte potência econômica do planeta e quando é ameaçado de alguma forma por outra economia os exércitos logo invadem esse local doutrinam, interferem nas decisões daquele e coloca-os em guerras, além de saquear a matéria prima desses países. Entretanto, o autor indaga sobre essa falsa proteção dos EUA, por este ter sido falho em conseguir conter a expansão da doença, por dentro do seu território e por todo o planeta.
O que a pandemia revela é que não é a superioridade que gera a hierarquia, é a hierarquia que gera a superioridade. Revela, também, que a hierarquia temporal é o resultado de uma violenta amputação de tempos históricos. Os países do Sul não vieram depois, não chegaram ‘atrasados’ à história global. Existiam antes e por vezes com culturas milenares que antecederam o contacto com o Norte. São posteriores porque o colonialismo separou violentamente o seu passado do seu futuro. Boaventura
A pandemia abre a oportunidade para uma transformação epistémica, cultural e ética que permita ver a diversidade entre países como diferentes formas de a sociedade global ser contemporânea de si mesma. E a diversidade não enriquece a experiência do mundo senão pela via da complementaridade. O que só será possível na exacta medida em que forem ganhando força as lutas anticapitalistas, anticolonialistas e antipatriarcais. Boaventura
Boaventura reforça que os hábitos adquiridos pela hierarquia que separa o inferior do superior, mais especificamente a hierarquia entre a natureza e a sociedade/humanidade foi desestabilizada pela pandemia, uma vez que antes usávamos dos recursos naturais como se fossem infinitos, sem pensar nas consequências do seu fim e com o novo coronavírus não passamos estar em guerra contra o vírus, porém a natureza é quem vem lutando para se defender deste emissário.
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